terça-feira, 23 de dezembro de 2008

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

domingo, 7 de dezembro de 2008

O Holocausto Não É Uma Questão de Opinião.


Preparemos as salas de conferências, os palácios dos congressos, o fórum das culturas, porque vão vir todos. Com suas engraçadas cabeças raspadas e seus líderes de casaco passado a ferro e mais passada ainda a consciência. Já não precisam ir ao paraíso libertário do Irã para explicar que nunca existiu a morte em massa, que o milhão de crianças exterminadas nos campos nazistas nunca deixaram ali seu último alento, que os dois terços de judeus europeus desaparecidos no magma de seis milhões de assassinados nunca tiveram nome. Agora poderão passear pelas belas ruas de Barcelona e dizer, em voz alta, que nunca existiu o Holocausto. Os negacionistas, a legião mais militante do revisionismo nazista, encontraram amparo no magnífico Tribunal Constitucional espanhol, e hoje já sabem que negar o Holocausto é uma questão de opinião, e não um ato de ignomínia, crueldade e anti-semitismo. Têm o amparo legal, e o céu caiu sobre nossas cabeças. Enquanto Ângela Merkel se desdobra pelos rincões do sentido comum, exigindo que a negação do Holocausto seja um delito na UE, na Espanha é diferente.


Do alto tribunal florescem as idéias do ultraliberalismo opinativo, e a Espanha passa a ser o país da Europa onde mais felizes viverão todos estes indesejáveis. A liberdade transformada na desculpa do fascismo.Pergunto-me, com minha maldade característica, se seria legal negar a existência das vítimas da ETA ou considerar que nunca existiu a dor terrorista. E, porque sei a resposta — e a aplaudo —, pergunto-me como é possível que alguém considere legal negar a maior tragédia da história da Europa. É uma loucura. E, sobretudo, é uma irresponsabilidade.Sim. Reconheço minha profunda tristeza. Por que esta decisão é um punhal no coração dos que ainda estão vivos, na lembrança dos que perderam famílias inteiras, povos apagados do mapa, gerações hipotecadas no buraco negro do horror. Creio que é uma burla às vítimas e um alento aos verdugos. Ou seja, é uma derrota da justiça, da memória e da dignidade.



Escrito por: Pilar Rahola. Publicado no El Periodico de Barcelona

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Israelense traz Mostra de Cinema Palestino

Queridos jovens, o jornalista José Roitberg achou essa divulgação e nos passou. Realmente é algo gravíssimo que transporta o conflito do Oriente Médio, só com uma visão e de forma deturpada, para o Brasil.

Realmente um absurdo, principalmente porque o organizador é um Israelense que comora o Al Nakba.

TEXTO

Para marcar o Dia Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino (29/11), o pesquisador Yuri Haasz, professor de Inglês e de Hebraico em Foz do Iguaçu, traz para a cidade a mostra de cinema "PALESTINA 1948-2008: 60 ANOS DA AL NAKBA". O evento ocorre nos dias 28 e 29/11 (sexta e sábado), no cinema do shopping Cataratas JL, com entrada gratuita.

Segundo o pesquisador, filmes e documentários são um ótimo meio de ampliar a visão das pessoas e quebrar preconceitos e paradigmas. "A formação ideológica que existe em ambos os lados impede de enxergar claramente a situação. Esta forma limitada de perceber a realidade não permite que uma avaliação moral bem fundamentada seja formada pelos dois povos", argumenta Yuri Haasz.

Este ano se completam 60 anos desde a expulsão de aproximadamente 750.000 palestinos (estimativa moderada) de suas terras pelas forças armadas sionistas, durante a formação do Estado de Israel. Este evento é chamado de "Al-Nakba", que em árabe significa "A Catástrofe". Yuri afirma que "embora 1948 seja a data de referência, foi de 1947 a 1949 que se deu
o início da sistemática expulsão do povo palestino de suas terras. Em 1967 houve a expulsão de mais 250.000 pessoas, aumentando o problema dos refugiados, que passaram a viver desde então sob domínio militar israelense".

De acordo com o pesquisador, que veio para o Brasil aos 14 anos, "a maioria da população israelense, assim como o mundo ocidental, não conhece as difíceis condições de vida às quais o povo palestino é submetido sob a ocupação militar de Israel. As informações passadas nas escolas e na mídia no mundo todo, com exceção de poucas mídias alternativas, não contam a realidade dos fatos, que são distorcidos em favor de Israel."

Solução para o conflito
Hoje existem grupos, embora ainda pequenos, dentro e fora de Israel, que lutam pela defesa dos direitos do povo palestino. De acordo com Yuri, há muitos israelenses que acreditam em uma solução justa para o conflito. "Há diversas organizações israelenses de direitos humanos que protestam ostensivamente contra os atos do governo, lutam pela devolução dos territórios ocupados e ajudam a reconstruir com as próprias mãos as casas palestinas destruídas pelo governo de Israel", explica.

"A surpresa de alguns ao saberem destes fatos se deve, infelizmente, a que estas organizações somente são divulgadas por veículos de mídia alternativa. A divulgação de sua existência é barrada na grande mídia corporativa que tem maior impacto na formação da opinião mundial. Há estudos que mostram que isso faz parte de uma campanha de propaganda política, que cumpre com uma agenda dos governos de Israel e dos EUA", diz.

De acordo com o pesquisador, a forma como o conflito é explicado na mídia mundial hoje em dia é pouco fundamentada em fatos históricos. "Há muita atribuição a fatores como extremismo religioso e anti-semitismo, mas os fatos mostram que houve uma enorme injustiça cometida contra o povo palestino, expulsando-o de suas terras de modo violento, causando a questão dos refugiados palestinos que até hoje não está resolvida. Esse é o real motivo do conflito, a injustiça", analisa.

Por outro lado, explica Yuri, os fatos indicam que houveram muitas escolhas feitas pelas lideranças palestinas - sempre houve várias , e com pouca união entre elas - que apesar de transmitirem uma aparência de lutar pela causa palestina apenas pioraram suas condições. "Não há uma unidade nem na Palestina nem em Israel. Muitas vezes a posição do governo não é a de seu povo, ou pelo menos não da totalidade dele", afirma.

Yuri argumenta que "a situação atual é de grave opressão da parte do Estado de Israel sobre a população palestina. Muitos israelenses apóiam esta opressão, pois apenas enxergam os atentados a bomba em meio à população, perpetrados por ativistas palestinos, e não compreendem que a opressão é o próprio motivo gerador destes atentados. Os palestinos por sua vez, oprimidos e desesperançosos, vêem estes atentados como uma forma legítima de manifestação e resistência. Porém, estes atos apenas denigrem sua imagem frente à comunidade internacional, fazendo-os perder sua superioridade moral na situação, e enfraquecendo suas chances de uma resolução do conflito de maneira diplomática e justa".

De acordo com Yuri Haasz, ao mesmo tempo em que os atentados são respostas a provocações por opressão da parte de Israel, e justificados desta maneira pelos palestinos, são a forma que Israel justifica ter razão frente à opinião pública internacional, para manter sua postura opressiva sobre os palestinos. Com isto, se mantém o ciclo vicioso que apenas se sustenta pelas concepções que cada lado tem do outro no conflito. "Caso houvesse uma maneira de se ver o outro como um humano, ou seja, um igual, as implicações morais dos atos de violência impediriam a sustentação deste ciclo", finaliza.

Dados
- Hoje há 4,6 milhões de refugiados palestinos vivendo em 11% de seu território original.
- A ocupação militar israelense é violação de lei internacional em várias instâncias. Segundo a 4ª convenção de Genebra de 1949 é ilegal, em território militarmente ocupado, construir assentamentos e estradas, expropriar terra, deportar pessoas, restringir sua liberdade de movimento, e ferir sua economia causando lhes desemprego e empobrecimento.
- As ações de opressão e domínio nos territórios são financiadas pelos EUA. Hoje a ajuda econômica deste país a Israel é de 2 a 3 bilhões de dólares ao ano. Desde 1949 até hoje, EUA enviaram para Israel mais de US$ 110 bilhões.
- Na primeira Intifada, de 1987 a 1993, foram mortos 1.100 palestinos civis, dos quais 250 menores, e 114 israelenses civis dos quais 5 menores.
- Na segunda Intifada, de 2000 a 2007, foram mortos 4.009 palestinos e 1.021 israelenses, dos quais 816 são crianças palestinas e 119 crianças israelenses.
- Israel dispõe de 3.930 tanques e 362 jatos f-16, é a 5ª maior potência nuclear do mundo.
- Israel é atualmente o maior violador das resoluções do conselho de segurança da ONU.
- Os EUA usaram mais de 40 vezes seu poder de veto junto à ONU para defender as violações de lei internacional de Israel.
- Desde o início das negociações de paz nos anos 90, o número de assentamentos israelenses ilegais em território Palestino quase dobrou, de 280 mil para 480 mil.
(Fonte: Occupation 101).

Aproximação
Yuri estuda o tema do conflito israelo-palestino desde que defendeu seu trabalho de conclusão de curso em Letras pela Unioeste de Foz do Iguaçu, "A Humanização da Imagem do Inimigo Através da Linguagem Cinematográfica: o caso Israel-Palestina".

Segundo o pesquisador a linguagem cinematográfica pode transformar a maneira de se perceber o inimigo. "Há estudos indicando que os filmes suscitam no espectador um 'sentimento de realidade' por identificação com os personagens ou com o contexto. Na medida em que os espectadores de ambos os lados do conflito sejam expostos a filmes que mostrem haver mais semelhanças que diferenças entre israelenses e palestinos, é possível haver uma aproximação", argumenta.

O objetivo da mostra de cinema é marcar a data e chamar a atenção para este problema que necessita da intervenção da comunidade internacional para que cessem os crimes e abusos de direitos humanos cometidos pelo estado de Israel contra o povo palestino.

A MOSTRA DE CINEMA
A vida do povo palestino sob a ocupação militar de Israel será exibida na mostra de cinema "PALESTINA 1948-2008: 60 ANOS DA AL NAKBA", que ocorre nos dias 28 e 29/11 (6ª e sábado), no shopping Cataratas JL, com entrada gratuita. A mostra já foi exibida este ano no Centro Cultural São Paulo e em Maringá, e agora chega a Foz do Iguaçu em sua terceira edição. O evento é promovido pelo Instituto de Cultura Árabe (ICARABE), com apoio da Itaipu Binacional e da Sociedade Árabe Palestina Brasileira de Foz do Iguaçu.

É uma oportunidade de conferir documentários e filmes de ficção pouco exibidos no circuito comercial e ainda discutir o assunto com grandes autoridades sobre o tema, que vêm para a cidade especialmente para o evento. Como parte da programação será realizada a mesa redonda "IMAGEM E REALIDADE DO CONFLITO ISRAEL/PALESTINA", dia 28/11, 6ª feira, às 20h no cinema do shopping, com participação do Prof. Dr. Emir Sader (USP, UERJ e CLACSO), da curadora da mostra Prof. Dra. Arlene Clemesha (USP e ICARABE) e do pesquisador e organizador da mostra Yuri Haasz (Foz do Iguaçu).


Datas: 28 e 29 de Novembro de 2008.
Local: Cinema Cineplex no Shopping JL Cataratas em Foz do Iguaçu.
Ingresso: Gratuito.

PROGRAMAÇÃO

DIA 28/11/08 – 6ª FEIRA

10h30
- ABERTURA SOLENE COM AUTORIDADES LOCAIS
- Crianças de Ibdaa (Children of Ibdaa, Palestina-EUA, 2002, 30min, documentário)
15h00
- Crianças de Ibdaa (Children of Ibdaa, Palestina-EUA, 2002, 30min, documentário)
- Blues Palestino (Palestine Blues, Palestina, 2005, 72 min, documentário)
17h00
- A Muralha de Ferro (The Iron Wall, Palestina, 2006, 52min, documentário)
18h15
- Coração aberto (Open Heart, Palestina/Reino Unido, 2006, 22min, documentário)
- Faixa de Gaza (Gaza Strip, EUA, 2002, cor, 74min, documentário)
20h00
- DEBATE: IMAGEM E REALIDADE DO CONFLITO ISRAEL/PALESTINA
- Dr. Emir Sader (Prof. de Sociologia da USP, Coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ, e Secretário Executivo do CLACSO – Conselho Latino Americano de Ciências Sociais)
- Dra. Arlene Clemesha (Profa. de História Árabe da USP, membro do Instituto da Cultura Árabe e curadora da mostra)
- Representante da Federação Palestina (FEPAL)
- Yuri Haasz (pesquisador do conflito Israel-Palestina, curador e organizador da mostra)


DIA 29/11/08 – SÁBADO
10h30
- Carta de Sara (A Letter from Sarah, Jordânia, 2002, 11min)
- De Futebol e Sonhos (Goal Dreams, Palestina, 2006, 86min, documentário)
14h00
- L'attente (L'attente, França-Palestina, 90min)

16h00
- Meu País Amado (Watani Habibi, Palestina / Nova Zelândia, 2007, 24min, documentário)
- Sardinhas (Tabaq al-Sardin, or The First Time I Heard of Israel, Síria / França, 1997, 17min)
- JENIN, JENIN (Palestina, 2002, cor 54min, documentário)

SINOPSES DOS FILMES

JENIN, JENIN

(Palestina, 2002, cor 54min - documentário)
direção: Mohammad Bakri
Alguns dias após a invasão israelense do campo de Jenin. O filme revela as marcas deixadas na alma daquela comunidade.

CRIANÇAS DE IBDAA
(Children of Ibdaa, Palestina-EUA, 2002, cor, 30min - documentário)
direção: Sarah Smith Patrick
Ibdaa, que em árabe significa criar algo do nada, é a história, a luta e as aspirações de um grupo de dança de crianças palestinas.

A ESPERA
(L'attente, França-Palestina, cor, 90min - ficção)
direção: Rashid Masharawi - elenco: Areen Omari, Mahmoud Al Massad, e Youssef Baroud
Entre ironia e desalento, uma evocação dos impasses do povo palestino por meio de uma viagem caótica e fragmentada de um diretor que está em busca de atores para a inauguração de um teatro em Gaza.

PALESTINA ESPERA
(Palestine is waiting, EUA-Palestina, 2001, cor, 10min - documentário)
direção: Annemarie Kattan Jacir
Há mais de 5 milhões de refugiados palestinos, muitas vezes indesejados, vivendo em condições limites em todo o mundo.

MEU PAÍS AMADO
(Watani Habibi, Palestina / Nova Zelândia, 2007, 24 min., documentário, cor, DVD)
Direção: Janice Abo Ganis & John Mandelberg
Sinopse: Cantores palestinos, expressando-se pela música, revelam as histórias das suas comunidades.

CORAÇÃO ABERTO
(Open Heart – Palestina / Reino Unido, 2006, cor, 22 min., documentário, DVD)
Direção: Claire Fowler
Sinopse: A sobrevivência de Jamal, de 9 meses, depende da realização de uma cirurgia do coração, possível de ser realizada apenas no hospital palestino Makassed, em Al Quds (Jerusalém), com o apoio de uma equipe de médicos voluntários do Fundo de Auxílio à Criança Palestina (em inglês, PCRF - The Palestine Children´s Relief Fund). Para realizar a operação, Jamal terá que viajar de sua casa, na região de Nablus, passar por todos os postos de controle israelenses instalados ao longo do caminho até chegar a Jerusalém. Coração Aberto revela o empenho do sistema de saúde palestino sob a ocupação, a partir das perspectivas do médico, do paciente e da organização humanitária

FAIXA DE GAZA
(Gaza Strip - EUA, 2002, cor, 74 min., documentário, DVD)
Direção: James Longley
Sinopse: O norte-americano James Longley viajou para a Faixa de Gaza em janeiro de 2001, planejando ficar duas semanas para coletar material para um filme sobre a Intifada. Acabou ficando mais de três meses, período no qual pôde conhecer a fundo a população. Faixa de Gaza é filmado quase que totalmente em estilo verídico e apresentado quase sem narração. Dotado de maior observação e menor argumento político, o filme apresenta um raro olhar sobre a inflexível realidade vivida nos territórios palestinos sob a ocupação militar israelense.

DE FUTEBOL E SONHOS
(Goal Dreams, Palestina, 2006, cor, 86 min., documentário, DVD)
Direção e Produção: Maya Sanbar e Jeffrey Saunders
Sinopse: Como pode um time sem pátria reconhecida, sem liga permanente, sem espaço para treinos e com integrantes da seleção dispersos ao redor do globo, competir no mundo do futebol moderno? Sendo jogadores dos territórios ocupados de Cisjordânia e Gaza, eles não podem treinar juntos em seu próprio país. Identidades pessoal e nacional se misturam e – de forma inusitada – a equipe de futebol mais se assemelha a um microcosmo palestino, junção de exílio, ocupação, sobrevivência e sonhos.

BLUES PALESTINO
(Palestine Blues / Palestina, 2005, cor, 72 min., documentário, DVD)
Direção: Nida Sinnokrot
Sinopse: Ao viajar pela rota do Muro de Segregação, as lentes de Nida Sinnokrot captam a cena em transformação. No vilarejo de Jayyous, perto de Qalqilia, a população camponesa empreende uma campanha não-violenta de resistência contra a construção do Muro. Este, por onde passa, apropria as melhores terras e arrasa plantações.

A MURALHA DE FERRO
(The Iron Wall, Palestina, 2006, 52 min., documentário, cor DVD)
Direção: Mohammed Alatar
Sinopse: Quando o pai da direita israelense, Valdimir Jabotinsky, formulou a irredutível estratégia da Muralha de Ferro, em 1923, foi dito que o diálogo com os árabes palestinos só seria empreendido quando estes estivessem totalmente derrotados. O filme aborda a história da implantação sionista na Palestina, até os mais recentes projetos de Israel para a construção de assentamentos permanentes, confisco de propriedades, furto de recursos naturais, privação de Direitos Humanos e criação de um sistema de segregação social baseado no fator étnico-racial, semelhante ao apartheid que vigorou na África do Sul.

CARTA DE SARA
(A Letter from Sarah , Jordânia, 2002, 11 min., cor, DVD)
Direção: Mutaz Jankot
Sinopse: Sara, garota palestina de 12 anos, relata sua vida diária, sua casa, o campo de refugiados onde vive, as passagens estreitas onde brinca, seus brinquedos improvisados e jogos; descrevendo ao mesmo tempo sua visão do conflito.

(Assessoria)

Hezbollah: escoteiros ou Juventude Hitlerista?

NYT, em 24/11/2008.
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2008/11/24/ult574u8975.jhtm

24/11/2008
Hezbollah vê crianças como partidários

Robert F. Worth
Em Riyaq (Líbano)

Num campo de futebol em Bekaa Valley banhado pelo sol do fim da tarde, centenas de jovens usando uniformes estilo escoteiro e lenços na cabeça, parados em pé de forma rígida, assistem uma banda militar tocar, seus integrantes carregam no alto a distinta bandeira amarela do Hezbollah, o movimento militante xiita.

Eles são adolescentes - 17 ou 18 anos de idade - mas têm os rostos severos dos homens adultos, com pouca barba, alguns deles com manchas escuras no centro da testa de se curvarem para rezar. Todos usam uma pequena foto do Ayatollah Ruhollah Khomeini, o clérigo xiita que liderou a revolução iraniana, no peito.

"Você é nosso líder", cantam os garotos em uníssono, conforme o oficial do Hezbollah caminha para o pódio e dirige a eles uma invocação do Alcorão. "Nós somos seus homens!"

Essa é a vanguarda do movimento jovem do Hezbollah, os Escoteiros Mahdi. Alguns dos jovens graduados reunidos nesta cerimônia irão se juntar ao exército guerrilheiro do Hezbollah, lutando contra Israel nas montanhas do sul do Líbano. Outros irão trabalhar na burocracia do partido. O resto irá provavelmente se juntar à base de apoio, apaixonadamente leal e de crescimento rápido, que tornou o Hezbollah a maior força política, militar e social do Líbano.

Numa época de resgate religioso em todo o mundo islâmico, a intensa devoção dos jovens não é estranha. Mas no Líbano, o Hezbollah - o nome significa o partido de Deus - conduziu essas energias do ambiente para um projeto altamente político: educar a geração mais jovem para continuar sua batalha militar contra Israel. A resistência da luta do Hezbollah transformou-o num modelo para outros grupos militantes em todo o Oriente Médio, incluindo o Hamas. E esse sucesso se deve, em grande parte, à ampla e extraordinária variedade de programas de temática religiosa para jovens e de recrutamento.

Há uma rede de escolas - algumas administradas pelo Hezbollah, outras filiadas ao movimento ou controladas por ele - amplamente protegidas do mundo exterior. Há uma rede nacional de clérigos que oferecem aulas de religião semanais para jovens nos bairros. Há um grupo para alunos de escolas e faculdades não filiadas que apresenta o Hezbollah para um público maior. O partido organiza acampamentos e viagens de campo não militares, e durante os feriados religiosos muçulmanos, ele organiza eventos para encorajar os jovens a expressarem sua devoção em público e para fazer trabalhos de caridade.

"É como se fosse um sistema completo, desde a escola primária à universidade", diz Talal Atrissi, analista político na Universidade Libanesa que estuda o Hezbollah há décadas. "O objetivo é preparar uma geração que tenha uma fé religiosa profunda e também esteja próxima ao Hezbollah".

A maior parte dessa atividade é alimentada por uma ressurgência xiita mais ampla no Líbano, que começou depois da revolução iraniana em 1979. Mas o Hezbollah foi além de qualquer outra organização ao mobilizar essas forças, tanto ao construir sua própria base de apoio quanto para imunizar a juventude xiita das tentações da sociedade diversa e principalmente secular do Líbano.

É difícil quantificar a influência do Hezbollah sobre a juventude libanesa por causa da extrema confidencialidade do partido e da ausência completa de estatísticas confiáveis no país. Está claro que as escolas religiosas xiitas, sobre as quais o Hezbollah exerce uma influência dominante, cresceram durante as duas últimas décadas de um simples punhado para uma grande rede nacional. Outras vias menos visíveis podem ser tão importantes quanto, como o aumento do número de clérigos associados ao movimento.

O Hezbollah e seus aliados também adaptaram e expandiram os rituais religiosos envolvendo crianças, começando cada vez mais cedo.

As mulheres, que exercem um papel importante no Hezbollah, mais do que em qualquer outro grupo radical islâmico, são especialmente importantes para criar o que é comumente chamado de "atmosfera de jihad" entre as crianças.

"Esta é a jihad das mulheres"
Conforme a noite caía na cidade de Jibchit, no sul do Líbano, uma mulher sozinha vestida de preto caminhou com determinação sob os holofotes em direção a um palco improvisado. Na sua frente estavam centenas de pais dos Escoteiros Mahdi, que compareceram para assistir a um dos principais eventos das vidas de suas filhas.

"Bem vindos, bem vindos", disse a anfitriã. "Agradecemos sua presença esta noite. Suas filhas estão vestindo essa roupa angelical pela primeira vez."

Munira Halawi, uma mulher magra, de 23 anos e integrante do Hezbollah, com um olhar direto e os modos apaixonados de uma evangelizadora, era a mestre de cerimônias de um ritual conhecido como Takleef Shara'ee, ou responsabilidade sagrada, no qual cerca de 300 meninas entre 8 e 9 anos vestem formalmente o hijab, ou o lenço de cabeça islâmico.

Para as meninas, o ritual é um momento de um significado simbólico tremendo, marcando o começo de um compromisso religioso mais profundo e a aproximação da vida adulta. Essas cerimônias, que já foram raras, tornaram-se comuns nos anos recentes.

Também foi um marco para Halawi, que vinha praticando com as meninas há semanas: ela agora é uma qa'ida, uma jovem líder que ajuda a supervisionar a educação das meninas mais novas.

Nascida em 1985, Halawi é de certa forma uma representante típica da geração mais jovem das mulheres que integram o Hezbollah. Ela cresceu durante o período em que o Hezbollah e seus aliados começaram a estabelecer o que chamam de hala islamiyya, ou atmosfera islâmica, na língua xiita do Líbano. E logo se tornou muito mais devota que seus pais, que cresceram durante uma época em que as ideologias seculares como o pan-arabismo e o comunismo eram populares no Líbano. Ela se casou cedo e teve seus dois primeiros filhos antes de completar 17 anos.

Conforme Halawi terminava sua apresentação, as garotas começaram a andar pelo corredor até o palco, vestidas em robes brancos de seda com gorros de pele. Bolhas de sabão caíam das asas. Uma máquina espalhava fumaça branca. O sistema de som tocava hinos do Hezbollah - vozes masculinas profundas ressoavam ao ritmo de uma marcha. Os pais aplaudiam com furor, as mães gritavam.

A cerimônia de duas horas e meia que se seguiu - na qual as meninas apresentaram uma peça sobre o significado do hijab e um clérigo do Hezbollah fez um longo discurso político - foi uma dose concentrada da ideologia do Hezbollah, evidentemente mesclando a doutrina milenar xiita com ataques furiosos contra Israel.

Muitas e muitas vezes, disseram às garotas que o hijab era um emblema muito importante da virtude islâmica e que era o poder secreto que permitia ao Hezbollah libertar o sul do Líbano. A luta contra Israel, disseram, é a mesma luta das figuras fundadoras do movimento islâmico xiita, Ali e Hussein, contra os governantes injustos de seu tempo.

Durante todo o evento, Halawi era a figura central no palco, introduzindo cada sessão da noite e recitando versos do Alcorão e suas próprias homenagens poéticas ao véu.

"Nosso véu é uma coroa incrustrada de jóias, digna e grandiosa, que Deus fez para que nós desabrochássemos", disse em certo ponto, olhando para a escuridão com um olhar de intensidade apaixonada. "Ele abriu a porta da obediência e do contentamento para nós".

Alguns dias depois, relaxando durante um chá na casa de sua irmã, Halawi, ainda vestida com uma abaya preta, roupa islâmica, expandiu o tema da cerimônia. A educação religiosa agora começa muito mais cedo do que na época de seus pais, explicou. As escolas islâmicas, algumas controladas pelo Hezbollah, começam as aulas de Alcorão já aos 4 anos de idade, e é comum para as meninas começaram a jejuar e vestir o hijab aos 8. Para isso tudo, a orientação da mãe é fundamental.

"Essa é a jihad das mulheres", disse Halawi.

Acampamento com um viés moral
À distância, ele lembra qualquer outro acampamento de escoteiros no mundo. Duas fileiras de barracas de lona de cada lado das margens do Litani, o rio azul que corre pelo sul do Líbano não distante da fronteira com Israel. Um parquinho de madeira feito à mão fica na entrada do acampamento, onde pinheiros balançam ao vento e os morros secos e marrons podem ser vistos à distância.

Então vêm a visão de dois grandes pôsteres com os rostos do Ayatollah Khomeini e do Sheik Hassan Nasrallah, líder do Hezbollah, fixos em postes no rio.

"Desde 1985 nós conseguimos educar uma boa geração
", diz Muhammad al-Akhdar, 25, líder de escoteiros, conforme mostrava o lugar a um visitante. "Tivemos 850 crianças aqui nesse verão, com idades entre 9 e 15 anos".

Esse campo é chamado Tyr fil Say, um dos lugares no sul do Líbano onde os Escoteiros Mahdi treinam. A maior parte do que eles fazem é similar às atividades dos escoteiros em todo o mundo: aprendem a nadar, a fazer fogueiras, amarrar nós e praticar esportes. Akhdar descreve alguns dos jogos dos jovens escoteiros, incluindo um em que eles se dividem em duas equipes - os americanos e a resistência - e tentam jogar uns aos outros no rio.

Os Escoteiros Mahdi também recebem visitas de guerreiros do Hezbollah, usando roupas camufladas e carregando rifles AK-47, que falam sobre lutar contra Israel.


Akhdar guiou um visitante em torno das barracas, onde os meninos estavam recitando frases do Alcorão como "a promessa" e "o vencedor do tempo", usando pedras. Havia também um túmulo meticulosamente arrumado, completo, com letreiro e decoração. No lugar da lápide havia uma pequena foto de Imad Mugniyah, o comandante do Hezbollah que foi morto em fevereiro e que era amplamente visto no Ocidente como o líder de décadas de bombardeios, seqüestros e ataques.

O grupo de Escoteiros Mahdi foi fundado em 1985, logo depois do próprio Hezbollah. Oficialmente, o grupo é como qualquer outro dos 29 diferentes grupos de escoteiros do Líbano, muitos dos quais pertencem a partidos políticos e os alimentam.

Mas os Escoteiros Mahdi são diferentes. Eles são um grupo bem maior, com um número estimado de 60 mil crianças e líderes, são seis vezes o tamanho de qualquer outro grupo de escoteiros libanês. Até seus movimentos de marcha são mais militares do que os dos demais, de acordo com Mustafa Muhammad Abdel Rasoul, líder da União de Escoteiros Libanesa. Enquanto os Escoteiros Mahdi estão sob o guarda-chuva da união libanesa, eles não tem filiação direta com o corpo escoteiro internacional sediado na Suíça. Por causa da reputação dos Escoteiros Mahdi de alimentar as forças armadas do Hezbollah, o partido se tornou extremamente protetor e raramente permite acesso a pessoas de fora.

Ainda assim, os oficiais do Hezbollah casualmente mencionam a ligação entre os escoteiros e as forças da guerrilha.

'Depois dos 16 anos, a maioria dos meninos vai para a resistência ou para atividades militares" diz Bilal Naim, que serviu como diretor dos Escoteiros Mahdi para o Hezbollah até o ano passado.

Outra diferença em relação à maioria dos grupos de escoteiros está no programa. A instrução moral e religiosa - em vez da atividade física - ocupa a maior parte do currículo dos Escoteiros Mahdi, e os líderes escoteiros aderem estritamente às lições estabelecidas em livros para cada grupo de idade.

Esses livros, dos quais obtivemos cópias com um oficial do Hezbollah, mostram um foco extraordinário nos temas religiosos e na preocupação de tempo integral com a luta do Hezbollah contra Israel. Os títulos dos capítulos, para a faixa etária entre 12 a 14 anos, incluem "Amor e Ódio em Deus", "Conheça seu Inimigo", "Lealdade ao Líder" e "Fatos sobre os Judeus". Os judeus são descritos como cruéis, corruptos, covardes e desonestos, e são chamados de assassinos de profetas. O capítulo sobre judeus coloca que "o Talmude diz que os que estão fora da religião judaica são animais".

Em cada capítulo, as crianças devem escrever ou recitar versos do Alcorão que ilustram o tema em questão. Elas são ensinadas a venerar o Ayatollah Khomeini - o Irã há tempos oferece apoio ao Hezbollah, fornecendo dinheiro, armas e treinamento - e os líderes do Hezbollah. Elas são ensinadas a odiar Israel e evitar pessoas que não sejam devotas. As perguntas no fim dos capítulos encorajam as crianças a "observar o coração" e "avaliar o coração" para checar por impulsos errados e encorajar os virtuosos. Uma nota para os instrutores os lembra que os jovens escoteiros estão numa fase sensível de desenvolvimento que deve ser considerada como um "lançamento na direção do compromisso".

Influências seculares
No Ocidente, a imagem do Hezbollah é normalmente associada a seus jovens guerrilheiros de barbas, vestidos com roupas militares camufladas e segurando rifles AK-47. Mas o cerne de guerrilheiros e empregados do Hezbollah - seus membros em tempo integral - é um grupo bem menor do que o de seus partidários. Essa categoria mais ampla, que abrange a maior parte de quase 1 milhão de xiitas do Líbano, inclui reservistas, que lutarão se necessário; médicos e engenheiros, que contribuem com suas habilidades; e simpatizantes.

Nesse sentido, uma figura mais representativa dos jovens seguidores do partido pode ser alguém como ali al-Sayyed. Um jovem quieto de 24 anos, Sayyed cresceu no sul do Líbano e agora trabalha como contador em Beirute. O Hezbollah ofereceu empregos para ele, mas ele prefere manter sua independência.

Mas a vida inteira de Sayyed foi vivida sob a sombra do Hezbollah. Ele freqüentou um colégio Mustafa, uma das escolas da rede nacional filiada ao partido, onde passava pelo menos cinco horas toda semana estudando religião e ouvindo seus professores rezarem pelos guerreiros do Hezbollah e pelo Ayatollah Khomeini. Depois da escola e durante os verões, ele estava com os Escoteiros Mahdi. Depois tornou-se um líder dos Escoteiros Mahdi.

Ele é extremamente devoto - recusando-se a cumprimentar mulheres com aperto de mão - e menciona sua vontade de lutar e morrer pelo Hezbollah como se isso fosse uma conseqüência natural.

"Eles nos formaram, então é claro que eu vou sacrificar minha vida por eles", disse ele enquanto olhava através da janela de um café em Beirute numa noite de outono. "Antes, os xiitas estavam numa condição deplorável".

Ainda assim, a geração de Sayyed também está, sob vários aspectos, mais exposta às tentações da sociedade secular e às vezes decadente do Líbano do que estavam seus antecessores.

Essa mudança é aparente até mesmo em Dahiya, ou subúrbio, o vasto e populoso enclave no extremo sul de Beirute onde vive a maior parte dos xiitas libaneses e onde o Hezbollah tem sua sede.

O que antigamente era um gueto severo onde homens de barba castigavam as mulheres que ousavam aparecer em público sem o véu, Dahiya hoje é um lugar muito mais aberto. Há lan houses, lojas de música e DVDs, restaurantes chineses e um parque de diversões chamado Fantasy World.

Não há consumo público de álcool, mas as ruas estão cheias de antenas parabólicas e televisões ao ar livre. Lojas de lingerie mostram pôsteres de modelos com pouca roupa em suas vitrines, e mulheres jovens andam em jeans apertados, com a cabeça descoberta.

O café onde Sayyed estava, na periferia de Dahiya, era típico.
Bandeiras do Hezbollah podiam ser vista desde a rua, mas no lado de dentro as pessoas sentavam em mesas de alumínio e bebiam cappuccinos, comiam doughnuts e ouviam música em seus iPods.

"O Hezbollah tenta manter a juventude vivendo numa atmosfera religiosa, mas eles não podem forçá-la", disse ele, olhando inquieto para a rua.

Sayyed mencionou Rami Olaik, um polêmico ex-integrante do Hezbollah que deixou o partido e no começo deste ano publicou um livro sobre a doutrinação do movimento e sua gradual decepção. O livro conta a luta de Olaik para reconciliar seus desejos sexuais com a disciplina do partido, e seu desgosto com a forma que integrantes do partido manipulavam a doutrina religiosa para justificar seus encontros com prostitutas. Alguns membros solteiros do Hezbollah adotam o "casamento temporário" para ter relações sexuais, um arranjo que é permitido por algumas autoridades xiitas.

Os oficiais do Hezbollah dizem que eles não podem coagir os jovens, porque isso apenas criaria mais rebeldes como Olaik. Em vez disso, permitem aos jovens uma grande liberdade no quebra-cabeça pluralístico do Líbano, confiando no poder de seu treinamento religioso.

Mas há um limite para a flexibilidade do Hezbollah. Todos os jovens membros e partidários são encorajados a desenvolver um forte amni, ou senso de segurança, e são alertados para tomarem cuidado com curiosos de fora, que podem ser espiões.

Depois que Sayyed falou com um jornalista estrangeiro num café por mais de uma hora, um jovem com um ar duro na mesa ao lado começou a olhar para ele. Parecendo repentinamente nervoso, Sayyed concordou em continuar a conversa no segundo andar do café. Mas ele parecia agitado, e depois adiou mais de uma vez outro encontro planejado para a semana seguinte.

Por fim, ele enviou uma mensagem de e-mail pedindo desculpas e explicando que ele não poderia comparecer a outro encontro.

"Como você sabe, vivemos em guerra contra Israel e os Estados Unidos", escreveu num inglês cambaleante, "e eles querem guerrear conosco (destruir) de todas as formas".

Tradução: Eloise De Vylder